O mestre alemão Rudolf von Ihering afirmou, em magistral obra, que: “A finalidade do direito é a paz, a luta é o meio de consegui-la, enquanto o Direito tiver de afastar o ataque causado pela injustiça, e isso durará enquanto o mundo estiver com os olhos bem abertos, ele não será poupado. A vida do Direito é a luta, a luta de governos, de classes, de indivíduos e a luta de povos”.
Infelizmente, desde priscas eras, o território anteriormente conhecido como Fenícia, hoje praticamente o Líbano (cinco províncias que se uniram após a 1.a Guerra Mundial), foi marcado por períodos constantes de guerras e invasões, tendo participado da maioria dos grandes impérios que marcaram a história conhecida.
Talvez a vocação do povo fenício, que transcendeu cidades e nações através do seu comércio, com todo um sistema de trocas, vendas e regras, com transações econômicas, além dessa luta constante pela defesa de direitos fundamentais, pela garantia dos direitos naturais de todo homem e mulher que lá viveu ou vive atualmente, tenha colaborado para uma das grandes paixões dos libaneses: o Direito.
Ao lado das escolas de Roma e de Constantinopla, por força do Império, a escola de Direito de Beirute talvez tenha sido a primeira assim concebida no mundo conhecido, tendo sido criada por volta do ano 200 d.C. e já citada por seu epíteto da escola desde o ano 239 d.C, conforme texto de São Gregório.
A mais famosa entre elas, a de Beirute se destaca no Império como centro cultural e de elevada formação de estudos jurídicos, para onde se dirigiam estudantes de todos os lugares, passando a ser depositária das Constituições imperiais para o Oriente, para onde eram transmitidas para publicação, ciência e guarda, em vista do Código Gregoriano, ficando à frente de cidades como Atenas e Alexandria.
Os professores da escola de Beirute (a cidade das leis) conjugavam a jurisprudência com o estudo do depósito de leis, o que lhes permitia, e aos seus alunos, acesso imediato às inovações legislativas do Império e à resposta da Chancelaria à consulta dos litigantes.
Papiniano, considerado o primeiro de todos os jurisconsultos romanos e Ulpiniano, ambos da escola de Beirute, contribuíram de forma extraordinária para a construção e desenvolvimento do Direito. Este último, apenas a título de exemplo, escreveu mais de 200 obras, tendo muitos trabalhos que acabaram sendo incorporados ao Digesto.
Também são da escola de Beirute, entre muitos, juristas como Gaio, Cirilo, o antigo, Patrício, Domínio, Demóstenes, Eudóxio, Anblico, Leôncio Teófilo e Anatólio, sendo possível afirmar que o Código Hermogeniano, provavelmente redigido em Beirute, abrange as Constituições de Diocleciano, de Constantino e de Valentiniano, contribuindo enormemente na elaboração do Corpus Juris Civilis.
A escola de Direito de Beirute contribui com a construção do Direito na história, marcando a civilização, até sua destruição pelo incêndio de 16 de julho de 551, causado por um terremoto.
Beirute e Constantinopla mantiveram o vigor da tradição após a queda do Império, aquela fazendo jus aos títulos de metrópole e de depositária de constituições imperiais para o Oriente que recebeu em razão de sua escola.
Certamente, o amor e a vocação pelo Direito continuam vivos entre os libaneses. Em nossas colônias, tanto no Brasil quanto em outros Países, verificamos uma quantidade imensa de libaneses e seus descendentes que atuam no campo do Direito, demonstrando vocação, talento, compromisso com o justo, responsabilidade e ética profissional.
No Brasil, felizmente, são muitos os libaneses e descendentes que figuram na Magistratura (inclusive nas mais altas Cortes do País), no Ministério Público, na Advocacia, na Defensoria Pública e na Segurança Pública, brilhando em suas carreiras e honrando as tradições do Líbano.
Peço licença aos queridos confrades da Academia Líbano-Brasileira de Letras, Artes e Ciências para prestar uma homenagem ao patrono da cadeira número 26, Adib Feres Sad.
Descendente de libaneses, nascido no Brasil, homem reto e profissional brilhante, dedicou sua vida a Deus, à família, ao próximo e ao trabalho bem realizado. Advogado que lutou todos os dias pela realização do justo no caso concreto, sem se preocupar com a opinião pública ou com as críticas. Pautou sua vida profissional na ética e na compreensão das misérias humanas, sempre manifestando uma palavra, um pensamento de compreensão, acolhimento, amizade, misericórdia e orientação para o bem e o correto. Não julgava, apenas compreendia e orientava.
Um verdadeiro advogado que muito ensinou aos que tiveram a honra e o privilégio de conhecê-lo. Honrou as melhores tradições libanesas e a Academia Líbano-Brasileira de Letras, Artes e Ciências nos dá a oportunidade de prestar-lhe esta homenagem.
2 Comments
Dr. Adib, querido amigo e colega de profissão. Parabéns pelo artigo que diz muito das nossa milenar história e cultura!
Parabéns pelo artigo, Adib!
Bastante esclarecedor sobre nossa história.