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Um estudo sobre Beirute, sua origem e consolidação ao longo da história

Beirute possui uma história rica e complexa, que encanta qualquer pessoa disposta a conhecê-la. Afinal, não é difícil se apaixonar completamente pela capital do Líbano.

Localizada na costa leste do Mar Mediterrâneo, Beirute é uma das cidades mais antigas do mundo, com uma história que remonta a mais de 5.000 anos. Atualmente dividida em 12 distritos, a cidade desempenhou um papel crucial ao longo das diversas civilizações que ali se estabeleceram ao longo dos séculos, tornando-se um centro cultural e econômico de extrema importância no Oriente Médio.

Parece que o poema de Antônio Pereira Duarte, em seu livro Saalam Aleikum, Líbano, intitulado “Paris do Oriente Médio”, descreve bem o que é Beirute:

Beirute linda
Beirute iluminada
Beirute cosmopolita
Beirute mediterrânea
Beirute do sol
Beirute farol
Beirute querida
Beirute da vida
Beirute-céu
Beirute-fé
Beirute-amor
Beirute-te-vi
Beirute-paz
Beirute das Mesquitas
Beirute do Mar
Beirute estrelar
Beirute
Bayrüt
Beyrut
Beirute forever! (Duarte, p. 41-42, 2020).

No entanto, embora Beirute seja extraordinária, sempre enfrentou períodos de estagnação em seu desenvolvimento. Após grandes eventos, como a Guerra Civil Libanesa, o Líbano teve que reconstruir sua infraestrutura e, consequentemente, sua capital também passou por esse processo. Essa reconstrução foi, em grande parte, concluída em 2009.

Antes e depois desse período, Beirute passou por diversos conflitos, internos e externos, seja por questões políticas ou por guerras.

Em 2020, o mundo testemunhou uma das piores explosões da história. A explosão no porto de Beirute causou inúmeras mortes e uma destruição massiva da infraestrutura, cujos impactos ainda podem ser vistos atualmente na região portuária.

Segundo Dallari (2020), houve, em certa medida, negligência por parte de determinadas autoridades do governo, considerando a magnitude da explosão, que só foi possível devido ao armazenamento inadequado de uma quantidade extremamente alta de materiais perigosos.

Apesar de todos os desafios – guerras, conflitos internos e explosões –, Beirute continua viva em sua essência como a grande capital libanesa.

Um pouco da história de Beirute

Em um artigo recente, Hadrovic (2024) relata que a primeira menção à cidade de Beirute data aproximadamente do século XV a.C., quando seu nome foi encontrado em uma inscrição em uma tábua de argila na cidade egípcia de Tell el-Amarna.

O nome que deu origem a Beirute provavelmente veio dos fenícios, que habitavam a região e se estabeleceram como grandes comerciantes, aproveitando a localização geográfica estratégica da cidade.

No entanto, o domínio fenício não perdurou ao longo dos anos, exceto em seu legado arquitetônico, que ainda hoje pode ser observado em diversas partes do Líbano e é essencial para a identidade do mundo árabe. Por volta de 60 d.C., Beirute passou a ser governada pelos romanos, tornando-se um importante centro cultural.

Ainda segundo Hadrovic (2024):

Os antigos romanos ocuparam a cidade em 64 a.C. e lhe concederam o status de colônia (Colonia Iulia Augusta Felix Berytus). Eles mantiveram seu nome comum, adaptando-o à expressão latina Berytus. Da administração romana, restam muitos vestígios arqueológicos de edifícios públicos na área da atual Beirute, como o hipódromo, o circo, os banhos, o teatro, a basílica e vilas residenciais (Hadrovic, p. 62, 2024).

No ano de 551, Beirute foi atingida por um terremoto que devastou a cidade. Esse evento parece simbolizar os muitos desafios e reconstruções que a capital libanesa enfrentaria ao longo dos séculos.

No início do século VII, o mundo testemunhou a expansão do Islã por diversos territórios, incluindo o Oriente Médio, o Norte da África e a Península Ibérica. Durante esse período, Beirute foi conquistada pelos árabes, deixando de fazer parte do Império Bizantino. Apesar da mudança de domínio, os árabes mantiveram o nome fenício da cidade.

Beirute então se tornou um centro administrativo e comercial de grande importância para a região. Ao longo dos séculos, passou por diferentes califados, como o Omíada e o Abássida, até a chegada dos cruzados à região.

Ahmet Hadrovic oferece uma visão geral sobre os diversos dominadores da capital libanesa:

Entre 1110 e 1291, Beirute esteve sob posse dos cruzados, como parte do Reino Cristão de Jerusalém […] O velho príncipe de Beirute, João de Ibelin (1179-1236), após batalhas contra Saladino (An-Nasir Salah ad-Din Yusuf ibn Ayyub, Salah ad-Din, 1138-1193), reconstruiu a cidade e ergueu seu palácio (Ibelin). Os árabes retomaram o controle da cidade em 1291, e Beirute passou a ser governada pelos drusos, um grupo étnico-religioso distinto. Durante o reinado do sultão Selim I (1512-1520), o Império Otomano ocupou a Síria e o território do atual Líbano em 1516 (Hadrovic, p.62, 2024).

No século XVI, os otomanos tomaram posse de Beirute após a vitória sobre os mamelucos (dinastia que dominava o território) na Batalha de Marj Dabiq. A influência otomana na capital foi marcante, tornando Beirute o principal porto do Levante, impulsionado pela significativa exportação de seda. Além disso, foi nesse período que, por influência europeia, diversas universidades foram fundadas na região.

No âmbito político, Beirute era controlada indiretamente, com a administração da região sendo delegada a famílias locais. Segundo Barakat (2004), no final do século XIII, a capital libanesa era uma cidade pequena, com aproximadamente 4.000 habitantes, sem grande importância política ou econômica. Ela segue dizendo:

Apesar de sua superfície reduzida, Beirute possuía todas as características de uma verdadeira cidade árabe: muralhas, serail, numerosos monumentos religiosos e civis, infraestrutura comercial especializada e uma população de diversas origens e confissões religiosas. Assim, as áreas urbanas se entrelaçavam, tornando Beirute uma cidade rica, onde as separações entre público e privado, civil e confessional eram difusas. Antes de 1860, as delimitações territoriais eram pouco definidas devido à exígua extensão da cidade. Ao contrário de Jerusalém, Istambul ou Damasco, onde bairros distintos permitiam que minorias religiosas tivessem sua própria administração, Beirute não possuía grupos confessionais separados, nem havia segregação profissional entre confissões. Além disso, não existia oposição entre bairros residenciais e áreas produtivas, pois todas as atividades ocorriam nos mesmos espaços. Nada na forma de vestir diferenciava os diversos grupos; nas ruas da cidade, o izar branco cobria todas as mulheres, cristãs e muçulmanas, dos pés à cabeça. (Barakat, p. 486, 2004)

Esse sistema indireto começa a desvanecer quando, em 1888, ocorre a criação do Wilayat de Beirute, uma província administrativa. Essa mudança foi acompanhada, ainda segundo Barakat (2004), de novas fisionomias na estrutura da cidade, com placas comerciais promovendo tecidos franceses e ingleses e nomes de cafés que apareciam tanto nos bazares intra-muros quanto na orla de Ras Beirute.

A dominação do Império Otomano chega ao fim com sua queda após a Primeira Guerra Mundial, depois de 400 anos de domínio. Após os acordos de Sykes-Picot (1916), a França passa a dominar o Líbano e, consequentemente, Beirute.

O país tornou-se independente em 1943, com o parlamento libanês aprovando revisões constitucionais que afirmavam a independência do país. Segundo Traboulsi (2012), a câmara aboliu a cláusula que declarava que a autoridade mandatária francesa era a única fonte de poder, seja político ou jurisdicional. Assim, o árabe foi reinstaurado como língua oficial do país, além de ser adotado um novo desenho para a bandeira libanesa.

Beirute agora é totalmente libanesa. E assim sempre será!

A consolidação através das reconstruções

Como mencionado anteriormente, Beirute foi erguida e reerguida diversas vezes. Talvez um dos acontecimentos mais marcantes no que diz respeito à destruição das infraestruturas de Beirute tenha sido a Guerra Civil Libanesa. A área central da cidade foi abandonada, com prédios destruídos pelos disparos e quarteirões completamente desolados.

Joe Nasr e Eric Verdeil trazem uma perspectiva interessante sobre as reconstruções pós-guerra no Líbano e, especialmente, em Beirute:

Os aspectos mais básicos a serem observados sobre a reconstrução pós-guerra em Beirute e, de maneira mais geral, no Líbano são a seletividade em seu planejamento e a fragmentação em sua implementação […] Em outras palavras, não houve um plano geral, nem uma visão coesa para lidar de forma abrangente com as questões relacionadas à recuperação pós-guerra. Não existia um ministério de planejamento e, embora o CDR tenha conseguido cumprir muitas das funções de tal ministério (como alguma coordenação de projetos e o direcionamento de fundos do exterior para certas atividades de reconstrução), essas funções nunca foram integradas a uma perspectiva unitária e visionária, operando, em vez disso, no nível da revitalização de setores específicos ou do estudo de determinadas áreas do país. Dessa forma, a fragmentação da reconstrução foi tanto espacial quanto setorial (Nasr e Verdeil, p. 14, 2008).
 

O “CDR” que os autores citam, refere-se ao Council for Development and Reconstruction, uma instituição libanesa criada em 1977. Ela foi criada para supervisionar os eventuais projetos de reconstrução e desenvolvimento no país.

Os autores demonstram, portanto, o quão difícil é, burocraticamente, estrategicamente e politicamente, realizar a reconstrução de uma cidade, quanto mais de um país.

Isso nos dá um maior apreço em relação ao Líbano. Esses dados só provam ainda mais a resiliência, a força e a esperança do povo libanês. O Líbano foi predestinado à existência. E Beirute é a prova viva disso.

Música de Fairouz sobre Beirute:

Li beirut,
Men qalbi salamon li beirut
Wa qubalon lil bahri wal buyoot
Li sakhraten
Ka annaha
Wajhu bahharen qadeemi […]

fontes:
BARAKAT, Liliane Bucciant. Beirut – a city with so many facesDela21, p. 485-493, 2004
DUARTE, Antônio Pereira. Salaam Aleikum, Líbano. Brasília: Gráfica Positiva, 2020.
DALLARI, Pedro Bohomoletz de Abreu. Conflitos no Líbano vão além de explosão e questões religiosas: para Pedro Dallari, as manifestações após a explosão no porto de Beirute são prova da contestação contra as elites tradicionais. [Entrevista a Marcelo Rollemberg]. Globalização e Cidadania. São Paulo, SP: Rádio USP (93,7 MHz), 2020. Disponível em: https://jornal.usp.br/wp-content/uploads/2020/08/GLOBALIZACAO-E-CIDADANIA-12-08-2020-PEDRO-DALLARI-1.mp3.
HADROVIC, Ahmet. The historical Beirut city in Lebanon. International Journal of Multidisciplinary Comprehensive Research, 2024.
NASR, Joe; VERDEIL, Eric. The reconstructions of Beirut. Hal Open Science, 2008
TRABOULSI, Fawwaz. A History of Modern Lebanon. 2. ed. UK: Pluto Press, 2012

fotos: Lebanonuntravelled / pinterest/ lebanoninapicture
oldbeirut-Artpal-jarin (ilustração)
Rauche- Lebanonuntravelled
Mesquita Al Amin - lebanoninapicture
Museu de Beirute - Lebanontravelled
Praça dos Mártires - Lebanontravelled
Museu da Guerra- Beirutes - Lebanontravelled
Museu da Guerra- Beirute - Lebanontravelled
Tawlet Mar Mikhael – Beirute- Lebanontravelled
Porto de Beirute (2020)- Pinterest
Beirute- Pinterest
Historiador e Mestre em Educação pela Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA)

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