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A Importância da Prevenção em Saúde Mental para a População Afetada por Conflitos Armados no Líbano

Vivemos numa época cheia de complexidades extremas, uma crise sem precedentes que afeta não só os nossos corpos, mas também as nossas almas, os nossos sentimentos e o tecido moral que nos une como sociedade. Como psiquiatra e alguém que trabalha diretamente em crises humanitárias, sinto que é importante avançar em direção a cuidados para a comunidade atingida pela guerra assim como para o que a rodeia.

Este tempo exige que olhemos profundamente além do sofrimento físico. Pede-nos que cuidemos uns dos outros, especialmente de nossas mentes e sentimentos. O impacto desta guerra vai além do que podemos ver. Isso abala nossos alicerces internos, provocando ansiedade, tristeza, medo e muitas vezes uma sensação de desamparo.

A vivência  de um conflito armado provoca uma das mais nocivas percepções psicológicas dos tempos modernos: a constatação de que os seres humanos não são responsáveis por seus destinos e tudo o que constroem poderá ser destruído inesperadamente.

Nessas situações limite desorganizadoras ficam suscetíveis tanto as populações atingidas pelo flagelo quanto pessoas que participam indiretamente da situação, e até os espectadores que se envolvem à distância com essa realidade adversa e incontrolável da guerra, relatada através dos veículos de comunicação, muitas vezes, em tempo real.  Estas situações estabelecem experiências e vivências emocionais geradas por esses fatos reais provocando, na maioria das vezes, percepções ameaçadoras da realidade. Frente ao disruptivo, a sociedade fica exposta a todos os grandes temores humanos simultaneamente. Sua impotência diante da finitude: tanto de sua vida quanto do que construiu.

As populações saudáveis de Países e/ou comunidades atingidas por tal violência disruptiva, vivem o estresse emocional, que poderá evoluir para um quadro potencialmente traumático podendo apresentar desajuste emocional/psíquico e o consequente adoecimento, momentaneamente, temporariamente ou permanentemente.

A saúde mental é um aspecto fundamental do bem-estar humano, e sua preservação torna-se ainda mais essencial nestes contextos de violência e guerra. Estes fatos disruptivos não apenas destroem vidas físicas. O sentimento de luto se torna uma constante, não somente pela perda de seus entes queridos, mas também pela destruição de lares, comunidades e identidades. Muitas pessoas são forçadas a abandonar suas casas, seus trabalhos e suas raízes, levando-as a um profundo sentimento de desamparo e desorientação. Essas rupturas podem desencadear uma série de reações psicológicas que, se não tratadas, podem levar ao desenvolvimento de traumas severos. A insegurança constante, a ameaça à vida e a incerteza sobre o futuro criam um ambiente propício para o desenvolvimento de transtornos emocionais/psíquicos como depressão, ansiedade, transtorno de estresse pós-traumático entre outros. Aqueles que permanecem em suas comunidades, enfrentando a violência diária, experimentam um estado de alerta constante que pode ser desgastante e prejudicial à saúde mental.

Desenvolver programas de prevenção em saúde mental para aqueles que vivem em situações de conflito é uma responsabilidade ética e social. Essas iniciativas não apenas ajudam a prevenir o desenvolvimento de traumas, mas também promovem a resiliência, a “cura” e a reconstrução das comunidades afetadas. Investir em saúde mental é investir na dignidade humana e na possibilidade de um futuro mais esperançoso para todos.

Os programas de prevenção em saúde mental são fundamentais para mitigar os efeitos traumáticos da guerra. Eles não apenas ajudam a tratar os sintomas de transtornos emocionais/psíquicos, mas também visam fortalecer a resiliência das populações afetadas. Um aspecto crucial desses programas deve ser o desenvolvimento da imunidade psíquica, que se refere à capacidade de enfrentar e superar adversidades emocionais e psicológicas à medida que desenvolvam o enfrentamento através de narrativas de seu sofrimento. Essa imunidade é essencial para promover a resiliência, que, por sua vez, é um elemento básico para o resgate da autoestima.

Esses programas podem incluir:

  1. Educação e Conscientização: Informar as comunidades sobre os efeitos da violência na saúde mental e como identificar sinais de sofrimento psicológico é essencial. Isso ajuda a reduzir o estigma associado a problemas de saúde mental e encoraja as pessoas a buscar ajuda.
  2. Apoio Psicossocial: Criar redes de apoio comunitário pode oferecer um espaço seguro para compartilhar experiências e sentimentos. Grupos de apoio e atividades comunitárias ajudam a restaurar o senso de pertencimento e conexão social que muitas vezes se perde em tempos de crise.
  3. Intervenções Culturais: Utilizar práticas culturais e tradições locais pode ser uma forma eficaz de promover a cura emocional. A arte, a música e a narrativa são ferramentas poderosas para expressar dor e trauma, facilitando o processo de luto e recuperação da autoestima.
  4. Treinamento de Profissionais: Capacitar profissionais de saúde mental, assistentes sociais e educadores para que possam identificar e intervir precocemente em casos de sofrimento psicológico é crucial. Eles devem estar preparados para lidar com a complexidade dos traumas relacionados a conflitos.
  5. Acesso a Recursos: Garantir que as populações afetadas tenham acesso a serviços de saúde mental é vital. Isso inclui a disponibilização de atendimento psiquiátrico e psicológico, medicamentos, intervenções assistenciais, psicoterapia e recursos de emergência para a prevenção do trauma. Esses atendimentos geram reconstrução das relações interpessoais e do sentido de pertencimento enfatizando, através do diálogo, a importância das relações humanas na promoção da saúde mental e na construção de resiliência. Por meio dessas experiências os indivíduos podem reconstruir suas histórias de vida, resgatar suas identidades e fortalecer suas conexões sociais, o que é crucial para a recuperação da autoestima e do senso de propósito.

6.Promovendo a Imunidade Psíquica e a Resiliência

Para que os programas de prevenção sejam eficazes, é fundamental que se concentrem no desenvolvimento da imunidade psíquica. Isso envolve o enfretamento destas vivencias disruptivas através do fortalecimento das habilidades emocionais e cognitivas baseadas nas trocas das experiências baseadas na expressão do desamparo, permitindo que os indivíduos enfrentem melhor as adversidades e recuperem seu senso de controle e autoestima. A resiliência, não é apenas a capacidade de resistir a esse estresse, mas também de se adaptar e crescer a partir das experiências desafiadoras.

7.Investir em saúde mental é investir na dignidade humana e na possibilidade de um futuro mais esperançoso para todos.

Conclusão

A guerra e a violência não apenas destroem vidas físicas, mas também têm um impacto devastador na saúde mental das pessoas. Desenvolver programas de prevenção em saúde mental para aqueles que vivem em situações de conflito é uma responsabilidade ética e social. Essas iniciativas não apenas ajudam a prevenir o desenvolvimento de traumas, mas também promovem a resiliência, a cura e a reconstrução das comunidades afetadas. Investir em saúde mental é investir na dignidade humana e na possibilidade de um futuro mais esperançoso para todos.

fotos:Marcelo Camargo -Agência Brasil / Carl Court- Getty Images
Dr. José Toufic Thomé, MD,PhD Psiquiatra e Psicoterapeuta / Doutor em Psicologia sobre “O Disruptivo em Saúde Mental”-Universidade El Salvador de Buenos Aires- Ar. / Coordenador da Assistência Psicológica do Gabinete de Crise do Consulado Geral do Líbano no Rio de Janeiro

5 Comments

  1. Excelente artigo Prof Thomé. Vamos nos preparar para um programa em atender os refugiados libaneses, inclusive para tratamento psicológico pós conflito.

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  2. Muito bom Prof Thome. Conhecendo a sua dedicação ao projeto SaHa Brasil da AMLB será excelente a sua orientação para atendermos em brev em os libaneses👏👏👏👏

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  3. Muito bom Prof Thome. Conhecendo a sua dedicação ao projeto SaHa Brasil da AMLB será excelente a sua orientação para atendermos em brev em os libaneses👏👏👏👏

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  4. Prezados Prof. Thomé.

    Alguns povos são “destinados” à passar pela mesma dor de um sofrimento causado pelas guerras incessantes.

    Nos continuamos sofrendo as consequências de uma guerra mesmo depois de 46 anos morando no Brasil.
    Não sei o que é pior para saúde mental ou física se é viver uma guerra ou assistir à uma guerra de longe sabendo que tem familiares, amigos e gente amada no meio de uma guerra Bárbara.

    O artigo escrito é de suma importância para discutir muitas questões que nos afligem nestes últimos tempos.

    Que Deus proteja o Líbano e todos os libaneses de todo mal.

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  5. Dr. José Thomé: Excelente artigo.

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