O contato com outros seres já tinha sido feito, e os astronautas embarcaram na nave rumo ao espaço infinito para encontrá-los. A tripulação era diversa: engenheiros, físicos, matemáticos, médicos, técnicos em informática, professores de linguística, psicólogos e até psiquiatras. Uma representação da complexidade e da criatividade humanas. Com um rugido, a nave partiu, deixando a Terra para trás.
Mesmo quando a “Sonda da Esperança” alcançou a órbita de Marte em 9 de fevereiro de 2021, tornando os Emirados Árabes Unidos o primeiro país árabe a chegar ao planeta vermelho, poucos sabiam — e menos ainda se lembravam — que o Líbano, nos anos 60, havia sido pioneiro no mundo árabe na corrida espacial. Um pequeno país, marcado pela resiliência e criatividade, ousou sonhar com as estrelas por meio da “Sociedade Libanesa de Foguetes” (Lebanese Rocket Society).
Tudo começou como um sonho acadêmico. O projeto foi idealizado pelo professor de matemática Manoug Manougian, da Universidade Haigazian, que, com um grupo de estudantes, decidiu desafiar os limites impostos pela tecnologia da época e pela condição econômica de sua nação. Eles começaram literalmente do zero: seus primeiros protótipos eram construídos com materiais simples, como papelão e pedaços de cano. Testes iniciais eram realizados em uma fazenda nas montanhas acima de Beirute, onde os foguetes eram lançados ao céu, cruzando o limite do possível e do imaginável.
O sucesso inicial chamou a atenção do governo libanês. Sob a presidência de Fouad Chehab, o projeto ganhou apoio militar. Especialistas em balística foram designados para colaborar, contribuindo com conhecimento técnico, logística e transporte. Esse suporte elevou o nível dos experimentos e resultou em foguetes mais sofisticados, batizados de “Cedro” — um nome que carrega o espírito do Líbano, simbolizado por sua emblemática árvore nacional.
A parceria entre a Universidade Haigazian e o Exército Libanês deu origem a foguetes como o “Cedro 1”, “Cedro 2” e “Cedro 3”. Em 1964, o lançamento do “Cedro 4” marcou um ponto alto do programa: o foguete atingiu 145 km de altitude, aproximando-se da órbita terrestre baixa. Para celebrar o feito, o governo emitiu uma série de selos postais com a imagem do foguete, imortalizando aquele momento na memória nacional.
Ao todo, entre 1960 e 1967, a Sociedade Libanesa de Foguetes projetou e lançou mais de dez foguetes, alguns deles alcançando impressionantes 450 quilômetros no espaço. No entanto, em 1966, um lançamento saiu dos planos. Um dos foguetes, destinado ao Mediterrâneo, acabou se desviando para perto de um navio da Marinha britânica. O incidente gerou tensões diplomáticas e, diante da pressão, o projeto foi abruptamente encerrado.
Com o passar dos anos, as memórias do programa desapareceram, soterradas pelos desafios políticos e pela guerra civil que devastaria o país. Os registros foram perdidos, e os talentosos estudantes que lideraram o projeto buscaram oportunidades no exterior. Era como se o sonho das estrelas tivesse sido apagado.
Mas o sonho não foi esquecido por completo. Em 2013, o documentário franco-libanês “Lebanese Rocket Society”, dirigido por Joana Hadjithomas e Khalil Joreige, trouxe à tona a história dessa ousada empreitada. O filme reviveu um momento singular na história do Líbano, celebrando a coragem de uma geração que, mesmo enfrentando limitações, ousou sonhar com o infinito.
De volta à nave espacial, os astronautas chegaram à borda do universo. O cenário diante deles era indescritível: uma tapeçaria de estrelas e galáxias, cores e formas que transcendem a imaginação. A grandiosidade os silenciou. Em meio ao deslumbramento, um deles murmurou: “Ah, por que não trouxemos um poeta? Apenas ele poderia descrever tamanha beleza com palavras.”
© Revista Libanus
2 Comments
Que fato histórico surpreendente!
É verdade, surpreendente.