Jorge Zahar (Campos dos Goytacazes, 1920 — Rio de Janeiro, 1998) foi uma das figuras mais emblemáticas do mercado editorial brasileiro, especialmente no que diz respeito à divulgação de ciências sociais e à introdução de uma nova era para as editoras de livros no Brasil.
Filho de pai libanês e mãe francesa, Jorge trouxe consigo não apenas as influências culturais de sua origem, mas também o espírito de empreendedorismo e visão global que marcaram sua trajetória. Em 1956, com seus irmãos Lucien e Ernesto, fundou a “Zahar Editores”, uma editora que viria a se tornar referência no Brasil. Quase trinta anos e mais de 1200 títulos depois, Zahar fundaria uma nova fase da editora, simplesmente nomeada “Zahar”, que continuaria sua missão de fomentar o acesso ao conhecimento e à reflexão crítica.
Autodidata por natureza, Jorge Zahar sempre teve um grande amor pela poesia, pela música e pelo cinema. Esses interesses se entrelaçaram com sua visão editorial, levando-o a criar uma editora que não se limitava à simples publicação de livros, mas que propunha um elo entre os leitores e as grandes questões da humanidade, exploradas através das ciências humanas. Seu catálogo se expandiu com obras de história, filosofia, antropologia, sociologia, psicanálise, além de áreas como educação, arte, música, cinema, teatro, televisão, biografias, literatura clássica e livros infantojuvenis. Com a Zahar, ele não apenas publicou textos de grande relevância, mas também ajudou a formar a base intelectual de várias gerações de leitores brasileiros.
Desde o lançamento de Manual de Sociologia em 1957 até as obras de referência dos anos 1990, Jorge Zahar publicou quase 2 mil títulos, abrangendo áreas como psicanálise, sociologia, história, cinema, filosofia, política, economia e muito mais. Com uma visão apurada, Zahar “revelou” Jacques Lacan ao Brasil e transformou História da riqueza do homem, de Leo Huberman, em um best-seller. Ele publicou obras de pensadores fundamentais como Freud, Marx, Fromm, Russell, Bauman e Zizek, entre outros, tornando-se uma referência para intelectuais, acadêmicos e estudantes.
A editora Zahar foi um marco na história do mercado editorial brasileiro, especialmente por sua dedicação à difusão das ciências sociais. Ao contrário de editoras tradicionais, que se concentravam na literatura mais popular, Zahar apostou em um catálogo que desafiava os leitores a pensarem criticamente sobre o mundo. Seu trabalho ampliou os horizontes da leitura brasileira, trazendo ao país textos essenciais de pensadores estrangeiros e enriquecendo a educação no Brasil. A editora se destacou por combinar rigor intelectual com uma herança afetiva, garantindo um legado duradouro no cenário editorial brasileiro.
Em 2019, o Grupo Companhia das Letras assumiu 100% do controle da editora Zahar, criando uma fusão que resultou em um portfólio impressionante de mais de seis mil títulos. Sob a direção de Ana Cristina Zahar, filha de Jorge, e com a participação de sua neta, Mariana Zahar, a editora continua a ter um papel relevante no mercado editorial, mantendo vivo o legado de seu fundador. Essa continuidade, com novas gerações à frente da editora, demonstra a capacidade da Zahar de evoluir com os tempos, mas sem perder sua essência fundadora. Ana Paula Rocha, atual diretora de operações, também tem sido fundamental no desenvolvimento da editora, garantindo que o espírito de inovação e qualidade perdure.
Com a morte de Jorge Zahar, em 1998, encerrou-se uma era de editores pioneiros no Brasil, como Ênio Silveira, Alfredo Machado e José Olympio, que transformaram o cenário editorial do país. “A palavra dele tinha grande peso em qualquer decisão tomada no mercado editorial brasileiro. Como editor, ele escreveu uma das páginas mais importantes da literatura brasileira”, disse Paulo Rocco, um dos renomados editores do Brasil, ressaltando a influência indiscutível que Zahar exerceu na indústria editorial.
A contribuição de Jorge Zahar vai além do que pode ser lido nas entrelinhas de suas publicações. Ele foi um criador de pontes entre diferentes culturas, conectando o Brasil ao saber universal através de livros. Ele soube traduzir a diversidade de sua herança libanesa e francesa em um modelo editorial único que ainda hoje é reconhecido por sua profundidade, qualidade e comprometimento com o conhecimento.
Em 21 de junho de 2018, o Consulado Geral do Líbano no Rio de Janeiro prestou-lhe uma homenagem póstuma, concedendo-lhe o “Prêmio Distinção – 130 anos da imigração libanesa no Rio de Janeiro”, reconhecendo o impacto duradouro de sua obra e o reflexo de sua origem libanesa em sua trajetória. Além disso, em reconhecimento ao seu papel fundamental na cultura brasileira e à sua contribuição para as letras, Jorge Zahar foi homenageado pela Academia Líbano-Brasileira de Letras, Artes e Ciências como patrono da cadeira Número 27, uma distinção que destaca a relevância de sua obra não apenas no Brasil, mas também na valorização da cultura libanesa e sua conexão com o Brasil.
A história de Jorge Zahar é uma história de coragem, visão e dedicação. Através de sua editora, ele revolucionou o mercado editorial brasileiro, abriu novos caminhos para a publicação de ciências sociais e proporcionou aos brasileiros uma nova forma de ver o mundo. O legado de Zahar não é apenas literário, mas cultural e educacional, e sua influência permanece viva em cada livro publicado e em cada leitor que se depara com as obras de sua editora.
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